segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Propriedade horizontal - responsabilidade por defeitos de construção; legitimidade; - Acordam do Tribunal da Relação do Porto

Consultar em:

http://www.trp.pt/jurisprudenciacivel/civel_4450/07.3tbprd.p1.html

Permilagem e valor da fracção podem ser fixados em função da localização e dos acabamentos de cada fracção, na edificação em propriedade horizontal?

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Questão colocada por mail de P.F.:
…”Na sua opinião fracções iguais valorizadas de forma distinta para efeitos de venda devido à sua localização dentro do empreendimento, ou fracções iguais com acabamentos mais ou menos luxuosos e consequente preço de venda diferente, devem ou não dar lugar a diferentes valores da permilagem?”
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A atribuição do valor à fracção é a questão fulcral da elaboração das PH's.
Aqui o sentido de justiça é fundamental, pois não estão padronizados os métodos de cálculo do valor.
Eu tentei resolver isso com a tabela que criei, pugnando por um sistema muito simples, para conseguir motivar quem elabora as PH’s à sua utilização, e poder ser eficaz. Caso se introduzam demasiados factores, corre-se também o risco de estabelecer uma fórmula muito complicada, que pode provocar interpretações dúbias e erros ainda maiores.
Na tabela de síntese que criei, obrigo à justificação da possível compensação de valores que seja feita a alguma das fracções (preterindo o cálculo apenas em função da justificação por áreas), obrigando ainda a que esse factor de correcção seja apreciado pelo técnico municipal que informe o pedido de certificação da conformidade da PH para com o projecto de arquitectura e a legislação em vigor.
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A questão que o leitor do blogue apresenta foi já abordada em alguns post's anteriores.
A diferença de valores entre fracções iguais, por localizações com condições diferentes no prédio será de ponderar, principalmente quando estiver em causa a orientação solar, havendo fracções explicitamente prejudicadas (por exemplo, se alguma estiver exclusivamente voltada a norte, e outras com boa orientação solar). Os meios naturais para a eficiência energética dos edifícios cada vez têm maior impacto sobre o valor das fracções de uma edificação, não só pelo impacto no respectivo consumo energético, mas também por questões de higiene, salubridade e saúde. Logo, não pode ser desprezado a relação de valor entre fracções, tal como não o é na definição de valor entre prédios com localizações distintas.
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Quanto à ponderação de valores diferenciados entre fracções, por terem materiais de acabamento diferentes, considero isso um erro, pois um particular pode adquirir qualquer das fracções na versão base, e posteriormente alterar tudo para condições internas fabulosas, sem que para isso careça de qualquer autorização do condomínio, que não poderá fazer repercutir isso numa alteração de valores.
E isto poderia até servir de justificação para “manobras” de favorecimento pontual a algumas fracções, nos exactos termos que acontece actualmente, por parte de alguns promotores imobiliários de menor idoneidade, que favorecem familiares e amigos que adquirem algumas das suas fracções, diminuindo-lhes o valor e a permilagem, conseguindo assim reduzir a respectiva comparticipação nas despesas de manutenção e conservação futuras do imóvel.
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Este acto decorrente, em si mesmo, prova a “mais valia” da diminuição de valor a fracções que, na prática, o promotor pretende privilegiar (sendo actualmente uma prática corrente, que a legislação possibilita e quase motiva).
Isto deve ser considerada uma fraude, e enquanto não for impedida continuará a criar enormes conflitos sociais e urbanos na edificação colectiva que actualmente se constrói ou divide em propriedade horizontal.
Como a permilagem vai servir fundamentalmente para definir a comparticipação das fracções nas despesas comuns, o seu cálculo em função de acabamentos das fracções e seu equipamento interno, daria origem a uma avaliação flutuável que poderia também provocar grandes injustiças e consequentes conflitos.
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Daqui a grande pertinência da questão colocada pelo leitor, pois é muito importante perceber nestes meandros que:
-"valor de uma fracção", para efeitos da sua venda, é uma coisa;
-"valor da fracção" para efeitos da sua permilagem na parte que interfere com o todo do prédio em que se integra, é outra coisa, completamente distinta da primeira.
- da mesma forma para efeitos fiscais, já que aí, o "valor", nem será uma coisa, nem outra; talvez ande num meio termo, que as finanças actualmente vincularam já a uma fórmula de cálculo matemático, mas que ficou completamente dependente de factores também aleatórios de localização do empreendimento, numa lógica de localização por zonamento urbano, definido em termos cartográficos, que tendo tido grandes vantagens relativamente à anterior anarquia, incorpora também as suas injustiças.
Ferreira arq

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Cálculo da permilagem e valor da fracção em Propriedade Horizontal - áreas de garagens, varandas ou terraços

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Questão colocada por mail de J.R.B.:
... "Moro num prédio de 10 andares com 4 andares por patamar, todos com a mesma permilagem - 22 por apartamento - que no conjunto dos 4 dá a soma de 84 .
A cave é do tamanho de um patamar que representa 84 de permilagem, que está registada como propriedade horizontal e que foi convertida em 7 garagens, umas maiores que outras;  e só tem de permilagem 32 no total das 7 garagens; isto para mim é muito estranho"...

Mesmo parecendo-lhe que não, neste caso a pemilagem das garagens terá sido bem calculada por quem elaborou o Título Constitutivo da Propriedade Horizontal (TCPH).
Passo a esclarecer:

A permilagem é definida em função do "valor" calculado para cada fracção, dando origem à proporção da comparticipação de cada fracção para as despesas de manutenção dos elementos e áreas comuns prédio.
Esta é a maior utilidade e razão de ser da definição da permilagem no prédio, e ao longo de toda a sua vida útil vai significar um encargo muito elevado a cada um dos condóminos.
Mesmo tendo em conta a resolução final da PH, aquando da demolição total do prédio e distribuição do seu valor residual entre proprietários (que se faz também em função da permilagem), a quotização de condomínio é a parte mais significativa entre os encargos a assumir e a futura possibilidade de receita final.
Para além disto, os conflitos de vizinhança por injustiça nos valores de comparticipação são um factor de peso a ter em conta, já que provocam a desmobilização dos condóminos para uma atempada e devida manutenção do prédio.
O desleixo na manutenção de um prédio de utilização colectiva é o princípio do seu fim - funciona como uma bola de neve - deve ser combatido em todos os factores de desmobilização.
É fundamental ter um TCPH devidamente constituído, assim como um regulamento de condomínio símples, funcional e justo.

A permilagem correcta a atribuir às garagens que constituem fracções independentes no prédio será mais fácil de entender com um exemplo bastante radical:

- se tivermos na PH um T2 - com apenas 100m2, ;
- e tivermos outro T2 igual - com 100m2 de área interna, mas que possua ainda o uso exclusivo de uma grande varanda com mais 100m2 (ou possuisse uma garagem fechada, com os ditos 100m2);
- seria completamente injusto partir do princípio que a distribuição de valor fosse efectuada numa razão directa do nº de m2 afectos a cada fracção;
- o T2 com a dita varanda ou garagem, não vale o dobro do T2 mais simples, e seria isso que ia acontecer. Iria pagar o dobro de condomínio, na comparticipação das despesas de manutenção dos elementos comuns, o que seria uma completa injustiça. Certamente daria origem a vários tipos de conflitos e boicotes entre os condóminos, tentando impedir despesas e obras de manutenção, por parte dos prejudicados.

É o tipo de situação que deve ser evitada numa PH, começando por uma elaboração adequada do TCPH. Conseguindo uma divisão justa das despesas de manutenção do prédio, não se desmotiva, a cada um dos condóminos, o assumir dos respectivos encargos indispensáveis à higiene e durabilidade do prédio colectivo de que são comproprietários. Neste estatuto de responsabilidade comum, o interesse em cuidar desse bem (de custo elevado), é de todos. É fundamental não desmotivar o respectivo dever de conservação, pois os prejuízos não serão apenas dos proprietários, mas também do espaço urbano em que o edifício se insere. Nada pior que um espaço urbano degradado - resulta quase sempre da degradação do edificado.

Por tudo isto, na tabela que elaborei e aqui divulgo (e que remeto gratuitamente a quem a pretender utilizar na elaboração das PH's), o cálculo do valor das fracções é efectuado em função das áreas afectas a cada fracção, mas vinculando na fórmula de cálculo a atribuição de um quociente de redução de valor para as áreas complementares (tais como as garagens, varandas, terraços, compartimentos de arrumos separados das áreas principais, etc).

E como cada caso pode ter uma importância mais ou menos relativa, nestas áreas complementares, esse quociente pode variar, por m2, entre 1/3 e 1/4 do valor atribuido ao m2 da área interna principal da fracção.
Consegue-se assim uma situação de justiça pela proximidade do valor real de cada tipo de espaço, na definição do valor total atribuido à fracção, assim como pela utilização de um mesmo critério entre todas as fracções que vão constituir a propriedade horizontal.
Infelizmente há muitas PH's constituidas onde se fez exactamente o contrário, favorecendo (diminuindo) o valor das fracções que estão já predestinadas a amigos ou familiares do promotor.

Claro, no seu caso a permilagem terá sido bem estabelecida - perto de 1/3 do valor para as garagens, relativamente às áreas principais - mas será importante garantir que a utilização dessas garagens é mesmo para esse efeito, e não para Armazéns de grande movimento, com outro tipo de implicações e desgaste para os elementos comuns da edificação ( o que por vezes acontece).

Será ainda de salientar que em termos de tributação fiscal existe também uma significativa redução dos valores que são imputados a estas áreas, aí definidas como "áreas dependentes".
(alterado em 20100203)
Ferreira arq